Suspeitos de fraudar concurso para delegado estão em liberdade
Os cinco presos suspeitos de envolvimento em uma fraude no concurso para delegado substituto da Polícia Civil de Goiás foram soltos após participarem de audiência de custódia na tarde desta terça-feira (14). Agora, eles responderão ao processo em liberdade. A sessão ocorreu na na 7ª Vara Criminal de Goiânia. Segundo a Polícia Civil, as irregularidades consistiam na compra de vagas em valores que variavam de R$ 120 mil a R$ 365 mil pela vaga. O concurso está suspenso.
O juiz Oscar de Oliveira Sá Neto decidiu pela soltura do médico Antônio Carlos da Silva Francisco, apontado como aliciador do esquema, além do bacharel em direito Armando Colodeto Júnior, o contador Fábio Alves de Oliveira, o ex-vereador de Palmeiras de Goiás, Magno Marra Mendes e Suzane Fonseca dos Santos, que teriam adquirido as vagas.
A Polícia Civil havia afirmado que três dos suspeitos tinham confessado o crime. No entanto, na audiência, nenhum deles confirmou relação com a fraude. Além disso, segundo o magistrado, não ficou comprovado que os suspeitos participavam de uma organização criminosa especializada em fraudes em concursos públicos. Por conta disso, ele explicou na decisão que isso pesou para colocá-los em liberdade.
“Ausente nos autos qualquer informação por parte da autoridade policial de comprovação de permanência ou da estabilidade de vínculo criminosos entre eles com a finalidade de praticar crimes. Assim, a prisão em suposta flagrância levada a efeito pela Polícia Judiciária, através do delegado de polícia, encontra-se eivada de nulidade insanável”, destaca o texto.
Entretanto, o juiz salientou que os suspeitos terão que cumprir algumas condições, como não cometer mais crimes, comparecer aos atos do inquérito, não mudar de endereço sem comunicar o judiciário e não consumir drogas.
Prisões e depoimentos
As prisões aconteceram no domingo (12), após a aplicação da segunda fase do concurso, em Goiânia. Segundo a Polícia Civil, Armando, Fábio e Suzane confessaram ter participado da fraude e citaram o médico como a pessoa que agenciava a vaga.
Já Antônio Carlos e Magno negaram envolvimento. No entanto, o delegado Rômulo Figueiredo Matos, da Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra a Administração Pública (Dercarp), disse não ter dúvidas que eles também sejam culpados.
“Nós prendemos os dois juntos. Eles marcaram um encontro em uma lanchonete, no horário do almoço das provas, para discutir as questões. Foi apreendida uma agenda do médico com várias anotações sobre a fraude. Inclusive, na agenda consta que ele [ex-vereador] pagou 30% do combinado para o médico. As famílias também são do mesmo meio, têm uma relação de 20 a 30 anos”, ressalta o delegado.
Na audiência, ninguém confirmou elo com o esquema. O primeiro a ser inquirido foi Magno. Ele afirmou que foi abordado antes e depois da prova. Após passar por uma revista minuciosa, teve o celular analisado pelos policiais. Novamente, assim como já havia dito, alegou que é inocente e se emocionou ao falar sobre a prisão.
“Falei que não ia confessar algo que eu não fiz. O delegado falou que seu eu colaborasse, sairia dali no mesmo dia. Gostaria de deixar claro isso. Além de estar privado da minha liberdade, estão manchando o nome da minha família”, disse, emocionado.
Em seguida, Armando passou a dar declarações ao juiz. Ele afirmou que foi levado à delegacia e colocado para assinar alguns documentos. Questionado se ele confirmava às declarações que fez à polícia, cujo termo tinha sua assinatura, ele respondeu: “Não confirmo esse conteúdo”.
Coação
Já Antônio Carlos confirmou que esteve com Magno antes do concurso e alega que pensou estar sendo seguido por “bandidos” ao serem analisados pela polícia e reclamou das condições em que foi preso.
“Eu não tive condições de defesa, fiquei a noite inteira com eles. Queriam uma história que não existia. Eu tinha que fazer qualquer coisa para sair de lá [delegacia]”, afirma.
Suzane informou que “foi coagida” pela polícia. Ela é de Brasília e também fez queixas sobre a forma como foi tratada após a prisão. No entanto, deixou escapar que está arrependida pelo que fez, mesmo sem confessar o crime. “O tempo todo fiquei em uma sala escura, sem tomar banho nem nada. Caí em um momento de besteira, mas estou arrependida”.
O último a ser ouvido foi Fábio. Ele afirmou que fez o concurso por curiosidade. O contador destacou que conheceu Antônio por meio de um advogado e negou ter participado do crime. “Assinei tudo que pediram. O que tenho pra dizer é que sofremos coação deles [polícia]”, diz.
Ele negou também o relato da polícia de que teria negociado a aquisição do diploma de direito – requisito necessário para tomar posse no concurso – e que ele não possuía. “Não confirmo”.
O delegado Rômulo Figueiredo Matos, responsável pelas investigações, negou que qualquer um deles tenha sido coagido. “De forma alguma, não houve qualquer tipo de coação. Todos tiverem oportunidade de ligar para advogados ou parentes, alguns quiseram e outros não quiseram, realizaram diversos telefonemas. Tudo foi totalmente respeitoso aos direitos humanos com livre exercício da ampla defesa. Quem falou, falou porque quis, dentro da perfeita legalidade”, afirmou ao portal G1.
A respeito da soltura dos presos em flagrante, o delegado disse que respeita a decisão e reiterou que o concurso foi fraudado.
“Decisão judicial não se discute, a gente cumpre e as partes interessadas poderão recorrer. Em relação ao inquérito, há provas suficientes e confissões de três candidatos. Eu posso assegurar que houve fraude sim no certame”, garantiu.
Ainda segundo ele, as investigações do caso continuam e a Polícia Civil pretende apresentar novos envolvidos. “A soltura dessas pessoas, obviamente, irá possibilitar a destruição de provas, mas nos concede maior prazo para concluir as investigações. Apresentaremos, em breve, mais provas e novos nomes de outras pessoas envolvidas”, concluiu.
Aliciador
Matos disse que o médico conseguia atrair pessoas de seu convívio pessoal e profissional oferecendo cargos públicos mesmo que estes não apresentassem todos os requisitos necessários.
“O contador pagou, antes do concurso, R$ 100 mil em duas parcelas e havia prometido repassar mais R$ 150 mil após assumir o cargo e fazer um empréstimo consignado. Ocorre que ele sequer possuía um diploma de direito, requisito básico para tomar posse e ficou entre os dez primeiros colocados. Para resolver o problema, o médico já estava com diploma falso confeccionado”, destaca.
De acordo com a polícia, outro preso informou que vendeu um carro e negociava uma casa para pagar a organização criminosa. O delegado disse que não pode revelar informações mais detalhadas sobre o modo de operação do grupo para não atrapalhar as investigações.